Jaqueline e Joana

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Joana já passou por isso, eu não. Ela já passou pela situação de estar com uma namorada, dar um beijo e ser expulsa do lugar. Eu nunca passei, mas pensava “E se eu passar, o que vou fazer?” Dizer que ela é minha namorada e apelar para os direitos humanos? É muito mais importante tirar uma certidão de casamento e poder falar “Somos casadas. Ela é minha esposa. A justiça reconhece minha união e você tem que respeitá-la também”. Isso foi um ponto muito importante para decidirmos nos casar oficialmente. O pai dela fez questão de mostrar para todo mundo que estávamos nos casando, não quis que fosse um casamento escondido, fez questão de fazer uma festa, de nos apresentar para a sociedade.

Para o casal heterossexual, o revolucionário é não casar, é só morar junto, abrir mão dessa coisa tão batida que é o casamento. Com a gente acontece o oposto: exercer o direito ao casamento civil, isso sim é revolucionário! É engraçado como os valores se invertem. É muito importante exercermos um direito que foi conquistado. Porque direito que não é exercido é direito perdido. Foi isso que nos moveu ao casamento civil e ao casamento religioso também, que aconteceu numa cerimônia budista.

Tanto é diferente que a minha mãe, que já sabia que eu saía com mulheres, que já tinha conhecido várias namoradas minhas desde que eu tinha 15 anos, quando eu falei para ela que nós íamos nos casar, ela surtou. Na festa de casamento, ficou chorando. Não eram lágrimas de alegria, eram de desespero. Tipo assim: não tem mais como ocultar, não tem mais como esconder da família, das outras pessoas… Quando perguntarem “Quem é aquela menina?”, não dá mais para falar “Ah, é uma amiga da minha filha”. Não, não é uma amiga, é a sua esposa, sua mulher.

E se em algum momento nós passarmos por uma dificuldade de saúde, quem vai entrar no quarto do hospital, sem problemas, seremos nós. Não vai haver aquela situação constrangedora do tipo “Quem é você? Você não pode entrar porque não é da família.”

Isso mexe com a cabeça das pessoas. A sociedade é machista. É muito importante a gente lutar pela mudança. É uma mudança cultural. Mas também é preciso ser generoso quando se percebe que existe alguém que não entendeu ainda – porque a forma como reagimos é o que a pessoa vai tomar para se transformar, para sair daquilo ou para se apegar àquilo cada vez mais. Por isso é importante acolher o que o outro ainda não entendeu, o que ele precisa entender. Eu mesma, quando me descobri gay, levei um tempo para me aceitar; quando tive a primeira namorada, pensava “Eu não sou gay, sou hetero, mas ela é uma pessoa especial”. Depois fui percebendo que não era bem assim. Se você mesma leva um tempo para se aceitar, para entender o que está acontecendo, acho que tem que dar um tempo para as outras pessoas também, para elas verem que é uma coisa normal, que ser gay não é nenhum bicho de sete cabeças.

Jaqueline Vasconcellos Carvalho (atriz) e Joana Vasconcellos Carvalho (professora de educação física), juntas desde 2013.

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