+ PAULO HENRIQUE
Já vivemos algumas situações de racismo com o Paulo que nos incomodaram muito. Foram situações que, talvez, não tivessem acontecido se fosse pai negro e filho negro, pois nos identificariam como família. É um racismo muito focado nele e só acontece porque ainda somos muito racistas. Mas, se você pensar bem, não é só discriminação de raça, é uma questão de ainda não se ter percebido que hoje não se pode mais julgar se as pessoas são da mesma família só porque se parecem ou não. De repente, um cara japonês e uma mulher loura podem ter um filho negro, e isto é uma família.
Existe essa questão da configuração de família que a gente precisa brigar agora para mudar. Não pode mais ser do tipo “Ah, tem um narizinho igual ao da mãe, o cabelinho igual ao do pai”, não é mais isso. Nós estamos juntos, tem amor ali envolvido. Qualquer configuração que seja, é família. Não dá para julgar pelo físico, não.
Hoje vemos uma mudança lenta e gradual dos casais, o que chamam de “normatização da homossexualidade”. Eu não vejo nestes termos, pois têm uma conotação ruim, como se ser normal fosse ruim; há uma tendência a enquadrar as pessoas. A homossexualidade sempre foi subversiva, estava ligada aos guetos, à sexualidade, liberação, libertinagem, àquela coisa subversiva. E não tem coisa mais subversiva hoje em dia do que pegar uma criança e levá-la para uma festa infantil com dois pais. Tem um ar de normalidade, mas é subversivo enquanto o Brasil não for como a Suíça. A gente não é Suíça. Eu não estou querendo ser “normal”, estou querendo ser igual a todo mundo, ser reconhecido pela minha personalidade, pela minha história, minha família. Sem tentar explicar “como pode” essa família de dois homens querer ser normal!
A maioria dos nossos amigos não é gay. A minha rotina de vida não é uma rotina do “estilo de vida gay”. Eu não vou para a academia, não me meto em boate, não tenho essa coisa de só ter amigo gay. Desse “estilo” a gente pouco faz parte, porque nossa rotina é de trabalhador, ainda tem que arrumar a casa, fazer comida, levar nosso filho para a escola, para a natação… Tem que trabalhar, botar grana, pagar os mesmos impostos. E às vezes a conta está apertada, o salário não entrou…
Nós já passamos pela nossa fase de sair, curtir. Se você for pela primeira vez a uma boate gay, é uma coisa fantástica. Porque você percebe que há pessoas iguais a você e que fazem coisas que você faz, que você gosta, e são “normais“. É uma descoberta. Mas passa, como tudo na vida. Então você entra em outra fase. Inclusive essa fase do gay contestador misturado com essa questão sexual, hipersexualizada, hipermarginal, essa fase, essa estratégia, ela envelheceu também. A estratégia agora é outra. É entrar no sistema e subverter de dentro para fora. É mais inteligente, nossa onda agora é essa.
Rodrigo de Mello (corretor de imóveis) e Gilberto Scofield Junior (jornalista), juntos desde 2002.